Pressentes o cálido gesto do chamamento,
habituado à dança movediça dos ombros
desnudos. Chegou a hora. Inclinas o rosto
na senda de pele, fechas os olhos como se
repetisses novamente o teu primeiro beijo.
Nas aulas de Balthus, ombros assim terminariam
o estudo de solfejo. A aluna mostraria os seios
como uma flor intacta. A professora delineando
o secreto distanciamento, levaria uma mão às
coxas suadas, talvez um beijo na curva do lábio,
embaraçoso, falhando a língua da rapariga.
Somos assim no duelo do apelo, na agitação
iniciática, animais ferozes no asfalto lançados, (animais)
que não encontram nunca o seu alimento.
Sombras estilhaçadas pelo estertor da noite.
O coração lateja quando o corpo decide em
que hemisfério se dilui, é ele que projecta
a periferia da lucidez. Clandestinos ultrapassamos
a barreira. As mãos presas pelos nós dos dedos.
Saltamos ao abismo. O abismo é um lugar
fechado em que respiramos um no outro,
onde o cheiro se funde e derrete em fadiga.
Volátil a voz distende-se no sussurro desprevenido.
A voz chega ao abismo e morre no oco do nosso
nome. O nosso nome é um corpo esponjoso
que se esfrega na fúria luminescente de desejo.
(Fernando Dinis)
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