Um poema de Sylvia Beirute - Ars Poetica
ARS POETICA
já não temos de: expor janelas, deitar
a língua de fora, beber o vinho, dividir a morte pelos benefícios
de mundos íntimos impessoais}
chegámos a uma arte nova - {tantas experiências, tantos
fernandos pessoas, al bertos, tantas palavras
que querem dizer outra coisa}
escrevemos apenas o gosto, o oposto semi-assimétrico
do que pensamos}
{e o que pensamos é semi-assimétrico do que sentimos}
se pensamos na metafísica da poesia, escrevemos
que é a sua absoluta não edição e acrescentamos que os
sentimentos mais humanos carecem de saneamento básico.}
se pensamos numa flor arrancada } escrevemos que
sermos conhecidos é premir publicamente o gatilho;}
se pensamos no peso exterior da alma,} escrevemos
as saudades com ligeiros vales } e uns búzios para cima }
e um dilúvio que estanca no caroço
que é afinal um continente
de recordações não interligadas por uma emoção} .
depois deitamos um rugoso manto silenciador,
{na poesia praticamente tudo é silêncio}
esperamos a chuva } e alguém se lembrará de expor janelas,
{forçá-las} deitar a língua de fora {a colheita de saliva},
beber o vinho {sentir o pisar da uva no lagar}.
nesse momento perdemos a carne com a sua privação}
e um poema cresce avulso a partir da planta dos pés}
e atravessa a beira-mar do vulto, perdendo a sua proporção,
a energia fragmentária de uma visão de vida
fiel ao cilício gradual de um tempo
esteticamente passando } semi-ininterrupto de infinitos.
inédito
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